PREZADOS LEITORES

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26 de março de 2013

Antinomia: o estatuto do idoso e a LOAS - leis 8.742/1993 e 10.741/2003


Cláudio Henrique de Oliveira Andersen

A antinomia que se apresenta quando confrontadas a lei 8.742/93 e a lei 10.741/03 exemplifica mais uma das inúmeras frustradas tentativas legislativas em se atender expectativas sociais e fornecer a devida tutela aos menos favorecidos.

Um conflito maior surge quando é trazido para a discussão o disposto no inciso V, do artigo 203, da Constituição Federal.

Por conta disto, o presente estudo sobre este aparente conflito pode representar uma mais abrangente proteção à pessoa do idoso, já que deste aparente conflito pode surgir uma interpretação mais abrangente à pessoa do idoso.

Da não observação correta do critério etário

Uma classificação de pessoas que são idosas é feita logo no artigo 1°, da lei 10.741/2003, que assim estabelece:

“É instituído o Estatuto do Idoso, destinado a regular os direitos assegurados às pessoas com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos.”

Ainda que exista uma faixa etária que determine quem deva ser considerado idoso, a proteção tão propagada não é preservada ou mesmo ampliada em outros dispositivos legais que visam uma melhor proteção ao idoso.

Esta afirmativa se deve ao fato de que a legislação penal utiliza esta faixa etária quando da qualificação do sujeito passivo do delito, ou seja, para o agravamento da pena de quem cometa delito contra uma pessoa com idade igual ou superior a sessenta anos.

Porém, em relação ao benefício assistencial previsto no inciso V, do artigo 203, da Constituição Federal, estabelece como beneficiário o idoso, sem menção de idade mínima. Ou seja, apenas a classificação como idoso bastaria para que ocorresse a concessão, claro sem ser esquecida a comprovação de estado de necessidade.

A mesma lei 10.741/2003, em seu artigo 34° tenta não gerar um conflito que já se mostra um tanto quanto evidente em relação à lei 8.742/1993, que trata da concessão do denominado LOAS.

O artigo 20, da lei 8.742/1993, assim prescreve:

“O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.”

Com esta fixação de uma idade mínima para a obtenção do benefício assistencial, e mais, com a mantença de tal distinção no tão propagado Estatuto do Idoso, especificamente em seu artigo 34, ficou evidente o tratamento desigual promovido aos idosos cuja faixa etária vai dos 60 (sessenta) anos aos 64 (sessenta e quatro) anos.

A Constituição Federal, ao fixar o objetivo da assistência social e a garantia do benefício assistencial ao idoso, deixou para lei infraconstitucional a definição da pessoa idosa.

O critério etário utilizado pela lei 8.742/93 está em confronto com o artigo 1º, lei 10.741/03, ao definir que é idosa a pessoa a partir de 60 anos.

Tendo a lei 10.741/03 fixado a faixa etária para que uma pessoa seja considerada idosa, há que presumir uma adaptação de todos os dispositivos legais que fixassem faixa etária diversa para situações de proteção à pessoa do idoso, o que não ocorreu quando tratado o benefício assistencial.

Da divergência quanto ao princípio constitucional

Se o benefício assistencial tem por objeto a proteção ao idoso, não é possível explicar a exclusão daqueles que se encontram na faixa etária compreendida entre os 60 (sessenta) e os 64 (sessenta e quatro) anos.

Um idoso que não dispõe de meios de garantir a própria subsistência aos 65 (sessenta e cinco) anos, não estaria em condições mercadológicas melhor aos 60 (sessenta) anos.

Essa exclusão de uma considerável faixa etária fere a proteção constitucional garantida ao idoso, e exemplifica a grande ausência de raciocínio por parte dos representantes do Poder Legislativo e do Poder Executivo quando da elaboração e execução de leis e outros dispositivos legais.

Quando da elaboração do Estatuto do Idoso, seu artigo 34° quando confrontando com seu artigo 3°, representou uma ausência de vontade de modificação de abrangência de um benefício assistencial, de maneira que seu próprio conteúdo já represente uma antinomia jurídica.

A falta de visão sobre a realidade do mercado de trabalho não permite a quem poderia ter redigido de maneira mais inteligente o Estatuto do Idoso a entender que um idoso com idade de 60 (sessenta) anos pode apresentar idêntica ausência de condições para prover o próprio sustento.

Porém, vale mencionar que o confronto observado não serve de apoio para que corrija um erro um tanto quanto óbvio para que tal atitude se transforme numa medida populista.

A ideia primeira é a de se demonstrar que o confronto aparente denota que o objetivo constitucional de tutela ao idoso foi desvirtuado, como já o era quando do advento da lei 8.742/1993, e que, com a lei 10.741/2003 se tornou um erro ainda mais arraigado.

Conclusão

O pensamento correto que se permite fazer é o de estimular a aplicação do princípio constitucional do idoso, somado ao dispositivo legal, contido na lei especial – Estatuto do Idoso- que definiu quem o seria.

Porém, a utilização dos dispositivos legais permite sua utilização somente até este ponto, já que a exclusão de pessoas para percepção do LOAS, que se encontrem na faixa etária dos 60 (sessenta) anos até os 64 (sessenta e quatro) anos(art. 34 do Estatuto do Idoso), contraria o preceito contido no artigo 1°, do mesmo Estatuto, que define quem é idoso, inclusive para fins do art. 203, V, da C.F.

Portanto, resolvendo-se a antinomia, podemos afirmar que o critério etário, para fins de percepção do LOAS (benefício assistencial do art. 203,V, da C.F.) deve ser 60 anos.

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* Cláudio Henrique de Oliveira Andersen é advogado e acadêmico do curso de especialização profissional em direito previdenciário na EPDS - Escola Paulista de Direito Social.



**Antinomia jurídica é uma contradição real ou aparente entre normas dentro de um sistema jurídico, dificultando-se assim sua interpretação e reduzindo a segurança jurídica no território e tempo de vigência daquele sistema. Segundo Tércio Sampaio Ferraz Jr., a antinomia jurídica é um tipo de antinomia pragmática segundo a classificação de Paul Watzlawick

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